Penso muitas vezes em desligar a televisão, para não ter de ver as notícias transmitindo o pior que pode haver na natureza humana. Fico confusa e perdida na necessidade de me confrontar com essas realidades e com a urgência de as filtrar e interpretar para a minha filha. Não é fácil explicar por que uma mãe faria mal a um filho, como, apesar das grandes diferenças culturais, se consegue deixar uma menina sozinha em casa.
Infelizmente, sei que isto acontece muitas mais vezes do que as que são noticiadas nos meios de comunicação, mas sentir-me encurralada perante as evidências impede-me de fingir que nada disto é possível. Talvez enfiar a cabeça na areia não possa nunca ser a solução: talvez agir seja tão imperativo como a própria condição humana. Porém, confesso, há dias em que prefiro viver num mundo onde finjo não saber que estas coisas existem. Prefiro viver a paz e a tranquilidade, o amor e a entrega da alma como únicas possibilidades humanas. Faço-o numa tentativa de esconder o erro para que não sirva de modelo. Nas minhas aulas, nunca o monstro, para que, não sendo nunca visível, não possa nunca ser copiado. Será possível ser assim no resto da nossa vida? Se não víssemos nunca o mal, será que nunca o concretizaríamos?
Um destes dias, uma das minhas alunas tomou uma decisão polémica que alterou o curso da sua vida, provavelmente de forma definitiva e preponderante. Não a posso julgar. Desejo-lhe o melhor, sabendo que as decisões marcantes nunca podem ser fáceis, mesmo que aparentemente pareçam levianas. É a vida dela. Terá de a viver confiando em si mesma.
Contudo, há uma vontade irresistível (gostava de acreditar que principalmente na adolescência) de criticar, avaliar e julgar o outro. Os pares dessa minha aluna debatem-se em comentários tão inúteis como incrivelmente injustos sobre a atitude dela. Estranho e irónico é saber que a miúda, cuja mãe se endividou em favor dela e que teve de emigrar muito por força das exigências materiais da mesma (deixando-a para trás ao cuidado de terceiros), critica a outra por ter deixado o conforto material e emocional para retornar a uma família que em tempos fora um perigo para ela. Se ela acredita que o amor que ainda assim resistiu lhes faz falta, quem somos nós para criticar? Talvez seja um erro. E se o for, só ela sofrerá as consequências.
Esta vontade irresistível de enfiar a cabeça na areia - que eu também sinto - não deveria manifestar-se na incapacidade de olhar para si mesmo. Quanto mais soubermos olhar para dentro de nós, quanto mais compreendermos a nossas próprias incongruências, mais conheceremos e aceitaremos o outro. Há momentos em que o silêncio é a única solução - porque nem sempre há palavras.
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