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quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Caminho

Ontem, a minha filha contou-me, durante a viagem de carro até casa, um episódio da escola que a havia deixado feliz. Estava a pequena tão entusiasmada que até eu fiquei ansiosa por saber o que tinha acontecido.
No final do teste de matemática, algumas meninas conversavam sobre os resultados de uns algoritmos e chegaram à conclusão de que nem todas haviam encontrado o mesmo número. Uma delas, a que tinha o resultado diferente, gabava-se de ter a certeza da sua resposta, menosprezando (pelo menos foi assim que as outras sentiram) o raciocínio das colegas.
O acontecimento provocou algum desconforto e, durante o almoço, não se sentaram juntas. A menina que almoçou sem as amigas do costume sentiu-se triste, e recolheu-se na sala de aula a chorar. Apesar dos esforços da auxiliar, ela não parava de chorar nem revelava a razão de tamanha tristeza. As amigas aperceberam-se e sentaram-se com a amiga, perguntando o que se passava. Ainda assim, ela recusava-se a falar, embora as amigas soubessem que, muito provavelmente, elas seriam a causa de tanta choradeira. Por isso, tentaram explicar que não tinham gostado da atitude dela, ao mostrar-se superior, mas que isso não queria dizer que não gostavam dela. Em vão. A menina queria ir para casa, estava desiludida, sentia-se traída. A sua melhor amiga estava entre elas - era o que mais a magoava.
A minha filha pediu, então, que todos se retirassem, até a auxiliar que continuava a tentar consolar a pequena. A minha achava que conseguiria animá-la e até fazê-la desabafar acerca do que a deixava assim tão triste, e essa certeza vinha-lhe de episódios similares no passado.
Começou por tentar diverti-la com algumas graçolas, mas a paciente estava firme na sua dor. Então, não havia outro remédio: enfrentar o elefante branco. E  disse-lhe que não gostaram daquela arrogância dela, que isso não as fazia sentir bem, que tinham ficado tristes com ela, que, às vezes, sentiam que não podiam confiar nela. Além do mais, nem sempre se sentavam juntas na cantina, por isso não havia razão para tanta choradeira. Entretanto, a minha acrescentou que o que ela realmente gostava era que todos se dessem bem na turma, que fossem unidos e não se zangassem como, por vezes, acontecia. Disto isto, emocionou-se também e acabou por se juntar à colega no derramar de lágrimas. Reconhecendo a comicidade da emoção, ria e chorava e isso, agora sim, conseguiu contagiar a outra. Terminaram a conversa a rir, falando de como era exagerada tanta tristeza e as fontes secaram. 
Nas palavras da minha filha, eliminar a tristeza dos outros é o seu grande dom. É assim como um dois em um: além de fazer com que os outros se sintam melhor, ela sente-se bem no processo. E, por isso, perguntou:
- Mamã, qual é a profissão que eu posso vir a ter em que seja essa a minha função: ajudar os outros, conversar com os outros...?
Respondi-lhe com várias opções, porque a vida, aos 9 anos, é mesmo isso: uma imensidão de possibilidades. 
- Estou tão feliz, mamã.
- E eu estou tão orgulhosa, meu amor.
Às vezes, tudo é tão simples.

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