Está quase a tocar e eu tenho de estar muito concentrada para
conseguir fazer o teste sem enganos, sem asneiras, organizado e
certeiro. As férias estão quase a chegar e este é só mais um esforço
para que tudo corra bem. Saturno, Júpiter, Neptuno. Latitude.
Meridiano... Ai... Está tudo a misturar-se dentro de mim. As galáxias
com as montanhas, os planetas com os rios. Chega! Vou desligar o cérebro
e não penso mais nisto. Quando lá chegar logo se vê. Vou fazer como o
Manel e divertir-me sem stress. Afinal, é só um teste. Só um teste... Só
um teste!!!
Não foi assim tão mau. Afinal aquilo até estava
escrito em português... É a minha língua! Que raio! Vou tirar boa nota,
tenho a certeza. Claro que entretanto já queimei dois ou três neurónios
com o nervoso enquanto o Manel continua divertido e animado. Um dia
ainda hei-se saber ser assim. Claro que as notas dele não são como as
minhas. Eu tiro sempre melhores notas... Mas, na verdade, isso interessa
para quê? Fico mais rica? Mais esperta? Ou não... Se calhar sim. Quero
acreditar que fico mais esperta e isso fará de mim mais rica um dia. E
isso que importa? Andam sempre a dizer que o que interessa é ser feliz.
Melhor nota a Geografia quer dizer que serei mais feliz?? Duvido... Cada
vez que penso no Universo fico é mais confusa... e assustada! Uma bola
suspensa à volta do Sol. E se caímos? Agarramo-nos onde? Aos meridianos
ou aos trópicos?!
Acabou! Não penso mais nisso! O teste até já
acabou e agora vou relaxar, espreitar o Luís do 9ºD a ver se ele hoje
olha para mim e depois vou ao bar comer qualquer coisa. Lá está o Manel,
sempre o primeiro da fila para comer. Isso é que ele é, sempre
divertido e sempre de barriga cheia. Se calhar é esse o segredo. Vou
lanchar a ver se me animo.
- Pára de me chatear, Maria! Não vou
falar mais no teste. Estou a comer a minha nata e concentrada nas
maravilhas que estas calorias vão fazer pela minha boa disposição! Já
viste o Luís? Anda. Vamos lá ver se ele hoje olha para mim...
Está ali ao fundo... A falar com a Teresa! Aquela enjoada. Não percebo
qual é a graça daquela miúda. Só porque tem o cabelo loiro acha que é
muito bonita... Ou os outros é que acham, sei lá. Vou passar mesmo à
frente. Se ele não olhar para mim, nunca mais penso nele! Prometo.
Estou quase. Ele está ali. Vou passar. Não vou olhar. A Teresa já está a ir embora. E...
- Filipa!
Ai... Estão a chamar por mim. Ele está a chamar por mim. É o Luís! Não acredito, é mesmo a voz dele.
- Filipa, correu bem o teste de Geografia?
Lá lhe respondi que sim e acabei a falar na porcaria do teste outra
vez. Já não é mau: melhor isto do que ele nem ter olhado para mim. Agora
é só pensar noutras estratégias e sei que vou ser feliz. Com testes ou
sem testes.
E depois vi o Manel. Estava feliz, claro. Preparadíssimo para as férias. Com boas notas ou más notas. Para ele era igual.
Saímos todos a correr, o portão grande estava fechado e o Manel estava a
tentar abri-lo. Mas não conseguia. Pudera! A empurrar pela parte mais
próxima das dobradiças... “Ca” burro!
- Ó Manel! Aplicas menos
força quanto mais longe empurrares da dobradiça. Básico! Aprendemos em
Físico-química. Ora vê! - E o portão abriu-se rapidamente e sem
esforço. O Manel, divertido, a olhar para mim. E o Luís, a passar por
mim, impressionado.
E eu, na certeza de que estudar me faria mais feliz, fui de férias. Não pensei mais nos testes, mas pensei muito no Luís.
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