Estava sentada num pequeno degrau que descia para a praia. O dia estava sereno: não muito quente, mas a ausência de vento oferecia uma leve sensação de conforto que só era quebrada pelo intermitente som das ondas a chegarem à praia. As mini-explosões de água a bater na areia incomodavam-lhe os sentidos, pareciam estrangeiras àquela serenidade, elementos que corrompiam a paz que emanava do local. A vontade dela era encontrar tranquilidade e por isso descera até à praia, esperando senti-la ali, onde tantos afirmavam que se encontrava. Olhava fixamente o mar, lá longe onde era calmo, tentando ignorar o enrolar ruidoso mais perto de si.
A decisão tinha de ser tomada e o tempo passava ao ritmo enervante das ondas do mar, sem parar, sem permitir uma pausa para que o silêncio trouxesse as respostas. Sabia bem que estavam dentro de si, embora se rendesse, por vezes, à atraente tentação de as encontrar nos outros. É mais fácil, talvez, escutar atentamente os conselhos alheios e decidir assim, livre de culpa, como indicação exterior contra a qual não se pode lutar. Porém, a educação que recebera impedia que se deixasse levar pelo que lhe era exterior, pelo que até pudesse ser mais fácil, pela decisão que não trouxesse sofrimento a ninguém, a não ser a ela.
Ele era o candidato ideal, não havia muito a apontar que pudesse servir como desculpa: educado, trabalhador, esforçado e dedicado. Além disso, seria covarde inventar nele as razões que lá não estavam. Desde o pedido que o tempo passara a ser pesado, que a ausência se transformara num refúgio, mas também que a realidade se impusera sem subterfúgios. Nada se alterara, na verdade, o mundo era o mesmo, as pessoas exatamente as mesmas, os sentimentos também.
Queria fazer jus à educação que recebera e ser capaz de enfrentar as lutas mais complicadas, mas esbarrava na impossibilidade de evitar o sofrimento, multiplicado pelos minutos que antecediam a resposta.
Desde o fim da adolescência que não havia grandes dúvidas dentro de si, a luta interior tinha terminado mais ou menos com a chegada da vida adulta. Mas depois, a simpatia, o charme, o carisma dele e principalmente a dedicação fizeram-na pensar que talvez fosse possível também aquela solução. Que talvez o amor, mesmo que mais intenso de um só dos lados, pudesse superar tudo. Era tão mais serena a hipótese de conseguir fazer parte de um mundo que já estava apresentado, com o qual não teria de lutar, sem tumultos para enfrentar... E tentou. Passaram anos numa aparente tranquilidade que tentava a todo o custo apreciar, mas as ondas continuavam a bater ruidosamente na areia.
O mar estava calmo, não havia vento e estava sol. Mas a inadiável chegada das ondas à praia fazia barulho. E incomodava-a.
A decisão estava dentro dela: ou no mar.
Não havia - ainda - nenhuma ela. Mas o ele não podia ser mais do que amigo. Talvez até a proximidade que conseguiram construir, apesar de tudo, tivesse já desvelado a realidade e, incapaz de a questionar diretamente, inventara o pedido: a hora de forçar a verdade.
Pouco importa, pensará ela, se ele já sabia ou não. Os factos serão sempre os mesmos, bem como o ruído do bater das ondas.
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