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segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Decisões e certezas (I)

Duas das grandes e maiores decisões da minha vida foram tomadas sem certezas absolutas, ou pelo menos, sem o grau de certeza que vi em outras pessoas perante as mesmas situações. Correndo o risco de me considerarem uma aberração, disparo: ser professora e ser mãe. E agora, se me permitem, explico-me e justifico-me. 
Tomei a decisão de ser mãe já depois dos 25 anos, até lá a maternidade não fazia propriamente parte dos meus planos, nem achava que tal condição teria de existir na minha vida para que me sentisse completa ou realizada. Aliás, lembro-me de ter uns 15 ou 16 anos e de, à mesa, em família, ter afirmado que talvez não quisesse vir a ser mãe. Não recordo a reação da minha mãe se é que houve alguma; mas a do meu pai... De tão incisiva e assertiva nunca me esqueci dela. A minha afirmação causou-lhe tamanha indignação que me surpreendeu. Claro que, naquela idade, o efeito foi precisamente o contrário, isto é, o meu pai proibiu-me, praticamente, de repetir tamanho disparate e isso só me deu vontade de o repetir vezes sem conta. Na verdade, eu nem sequer disse que não queria ser mãe, só admiti essa possibilidade, mas a reação dele fez-me pensar que essa minha decisão parecia, naquele momento, muito pouco minha. Quando ouço mulheres indignadas por lhes ser constantemente perguntado quando chegam os rebentos, como se de uma obrigação se tratasse, desconfio que sentem o mesmo que eu senti aos 15 anos naquela mesa de jantar. 
O meu pai ainda era caloiro na condição de pai de uma teenager, caso contrário saberia que os adolescentes pensam que já sabem tudo e que quanto mais controverso o tema mais apetecível se torna. A minha mãe, professora, conhecia-me um pouco melhor. Além disso, penso que o meu pai até deveria ter ficado feliz com aquela minha afirmação; afinal, qual pai de adolescente não ficará feliz em saber que a filha não quer ser mãe??
Passou talvez uma década até que a ideia da maternidade começasse a ganhar alguma forma, e passasse de uma probabilidade a um desejo. Confesso, porém, que o desejo se revestia de imensas dúvidas e perguntas. Eu não tinha a certeza absoluta de que gostaria de ser mãe, ou pior, se estaria à altura do cargo! O meu modelo tinha sido o melhor de todos, tão bom que me criara esta capacidade de equacionar, refletir, pensar e tomar decisões em consciência. Aos 29 decidi e, felizmente, aconteceu: engravidei. 
As afamadas maravilhas da maternidade darão muitos outros textos, mas no de hoje cabe apenas dizer que o momento em que a Mafalda se deitou no lado de fora do meu ventre, naquele segundo em que os nossos olhares se cruzaram pela primeira vez, eu tive a certeza de que aquele seria o meu papel principal nesta vida. Curiosamente, e isto é rigorosamente a verdade, a enfermeira que puxou a minha filha para o mundo, e com quem eu tinha desenvolvido uma relação bastante divertida nas últimas 3 ou 4 horas, deixou, premonitoriamente, de me chamar Filomena e passou a chamar-me Mafalda. Naquele momento, a Filomena tinha, de facto, desaparecido, ou pelo menos nunca mais seria a mesma.

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